quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

A SESSÃO DA TARDE QUE PRESTAVA

           Imagine ligar a televisão na Sessão da Tarde da Rede Globo e, em vez de encontrar os filminhos enjoativos que ela exibe hoje, dar de cara com Frank Sinatra, Rita Hayworth, Elvis Presley, Gene Kelly, Fred Astaire, Marilyn Monroe, a dupla Dean Martin & Jerry Lewis, Judy Garland, Humphrey Bogart, Bette Davis e, quando os caras estavam inspirados, até Charles Chaplin! Sim, isso existiu um dia. Era essa a Sessão da Tarde dos meus tempos de infância e adolescência. Foram essas maravilhas que eu cresci assistindo. Quando eu conto isso para a garotada da novíssima geração de agora que está redescobrindo a Hollywood Old School, vejo os olhos deles brilharem. Eles não acreditam que um dia a televisão brasileira já exibiu estas preciosidades. Sim, exibiu. De graça e o dia todo, todo dia.

          Naqueles tempos em que não existia TV a cabo, e que cursos à distância eram apenas um monte de apostilazinhas vendidas por empresas picaretas que colocavam anúncios em revistas em quadrinhos e, portanto, não tinham credibilidade alguma, os filmes da Sessão da Tarde Que Prestava foram meu primeiro curso de interpretação à distância. Siiimmm, porque observar aqueles atores e atrizes trabalhando era o mesmo que ter uma mega-aula de teatro à distância. Qualquer um que se dispusesse a gravar aqueles filmes e estudá-los (e muita gente faz isso até hoje) aprendia muita coisa. Certo, a observação não substitui a prática, não substitui um curso de arte dramática ao vivo, mas que aquilo era melhor que muitos cursinhos de teatro meia-boca que existem por aí, com certeza era.





          Sou filha de um homem fanático pela Velha Guarda de Hollywood, e para ele a maior realização deve ter sido a invenção do videocassete. Meu pai gravava esses filmes e os assistia incontáveis vezes. Foi graças a ele que eu não só aprendi a amar estes filmes, mas aprendi muito sobre aquela época brilhante da história do cinema, pois ele comprava livros e revistas sobre o assunto, lia e depois me dava para ler. Resultado: fiquei irremediavelmente viciada nas melhores coisas que a humanidade já produziu em matéria de cinema. Não que eu não curtisse os filmes do meu tempo, pelo contrário, curti muitos; mas é que em vez de jogar meu tempo e minha grana no lixo com aqueles filmes teens do tipo “turma da praia” ou “gatinhos e gatinhas de colégio”, que eram febre nos anos 80, eu via os filmes dos gênios que eu citei no primeiro parágrafo deste texto. E quer saber? Não me arrependo nem um pouco. 

          Agora vem a parte triste. Eu digo a verdade à garotada que tem You Tube e Google, enfim, que tem internet, mas que não tem preguiça e adora pesquisar sobre estes filmes: que as crianças e adolescentes da minha época não aproveitavam este privilégio. Pelo contrário: eles tinham um baita preconceito. Pré-conceito: o tal do “nunca assisti, mas não gosto”. Durante anos eu pensei ser a única pessoa da minha idade que tinha este gosto cinematográfico. Só fui encontrar gente da minha geração que curtia cinema Old School quando entrei na faculdade. 





          Costumo dizer que brasileiro é criança: só gosta de filme colorido, dublado e lançamento. Nosso povo não é educado para gostar de verdade da Sétima Arte. Sim, pois quem realmente é fã de cinema curte filmes de todas as épocas, e não só os lançamentos. Se você acha que um filme de cinco anos atrás é velho e que só filme novo presta, precisa rever seus conceitos.

          E foi com base nessa babaquice que as emissoras foram, aos poucos, tirando esses filmes antigos do ar. Primeiro substituindo-os por coisas maravilhosas como "ET" e a série "Indiana Jones", que eu adoro, e depois trocando-os por lixo mesmo. Naquela época, surgiu a TV a cabo, que era alternativa para quem queria se deliciar com nossas amadas “velharias”. Na TV a cabo não havia essa de “não vamos exibir tal filme porque é preto e branco”. Pelo contrário – tinha até filme mudo.





          Depois, a televisão a cabo no Brasil (digo no Brasil porque no resto do mundo felizmente não tem isso) começou também a banir qualquer filme feito antes de 1980, depois qualquer filme feito antes de 1990, e agora só exibe filmes feitos depois de 2000. E foi assim que a nossa TV a cabo conseguiu empobrecer tanto quanto a TV aberta em matéria de cinema.

          Está certo, não que todos os filmes atuais sejam ruins, há coisas lindas recém-lançadas. E não que todos os filmes da Old School sejam bons – muitos deles são apenas “antiguinhos” e envelheceram bastante. Eu, por exemplo, tenho paixão total pelo cinema dos anos 30 e 40, mas assisto a filmes de todas as épocas, e uma das coisas que mais gosto (ainda) é ir ao cinema. Como eu já disse, há filmes bons em todas as épocas. Mas o nosso público precisa saber disso! Se pelo menos as emissoras de televisão deixassem...


Texto já publicado no blog BlahCultural

4 comentários:

  1. Outras sessões de cinema bem marcantes para mim foram o Cineclube, Campeões de Bilheteria, Classe A;
    e até os populares: Festival de Sucessos, Festival de Verão, Festival de Primavera, Festival de Férias, Faixa-Preta, Supercine, Festival Nacional, Segunda Sem Lei, Sexta Mistério, Sessão Coruja, Cine Trash, Cinema em Casa, Sessão das Dez, Sessão Western, Casa do Terror.
    A Globo no sábado à noite passava: Supercine, Sessão de Gala, Sessão Coruja I, Sessão Coruja II, e se desse tempo, Sessão Coruja III, em outras palavras, 5 filmes.
    Não sei se você chegou a ver, mas em determinado ano no começo dos anos 90 (não lembro o ano exato), a TV Cultura, no período do Carnaval, resolveu exibir de sua programação, somente o telejornal; todos os outros horários foram preenchidos com filmes antigos, 24 horas por dia de filmes antigos, eu fiz um esforço hercúleo para não dormir, mas felizmente a TV Cultura passava duas vezes todos filmes se não me falha a memória. Parecia tv por assinatura. Assisti todos, só tive de me programar bem.
    Pena que ela sé fez isso uma única vez pelo que me lembro.

    Ah, já ouviu falar do oldflix (https://www.oldflix.com.br/
    )? É a netflix dos filmes antigos, veja lá.

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  2. Verdade, a TV brasileira já exibiu bastante esses filmes, mas na minha memória afetiva ficaram o Corujão e a Verdadeira Sessão da Tarde. Obrigada por comentar! Gostou, divulgue! Abçs :)

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  3. Eu fui uma das privilegiadas que assistiu "Sete Noivas Para Sete Irmãos", "Cantando na Chuva", "O Fantasma Apaixonado" e os clássicos de Jerry Lewis na Sessão da Tarde, só para citar alguns. Nessa época nasceu minha paixão pelos filmes das décadas de 30, 40 e 50, paixão que dura até hoje!

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